quinta-feira, 19 de março de 2009

As Correntes d`Escritas



A iniciativa, patrocinada pela Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, Correntes D`Escritas, caminha, a passos largos, para sua adolescência. Este ano realizou-se, pela décima vez, este evento, que acompanhei, interessada e discretamente como é meu hábito, desde o seu arranque.
A razão principal deste interesse é claramente pessoal, e relaciona-se com o prazer que sinto na leitura e, consequentemente, com a possibilidade de ouvir e aprofundar conhecimentos sobre grandes escritores que me habituei a ler, como por exemplo Leonardo Padura, Carlos Ruiz Zafón, e tantos outros.

Tenho, aliás, muita pena que nunca tenha sido possível a vinda do meu escritor favorito, Mário Vargas Llosa, para que nos pudesse contar onde foi buscar inspiração para escrever o fantástico “Quem Matou Palomino Molero” ou para que nos respondesse a questões sobre a corrupção e o autoritarismo típicas das ditaduras, particularmente das latino-americanas, bem presentes na obra “A Festa do Chibo”.
Entendo também como positiva, a deslocação dos escritores às escolas para contribuir para a luta, bastante dura, pelo fomento da leitura e da escrita. Nestes momentos, valorizámos de tal modo os autores que nos esquecemos de destacar a importância da nossa escrita e da que os nossos alunos efectuam, facto que é sempre referido pela generalidade dos autores nas diversas acções desenvolvidas. O meu desejo sincero é que esta iniciativa contribua para fomento da leitura e mesmo para o aparecimento de jovens escritores que podem ser influenciados pelas interessantes histórias de vida que alguns apresentam.
É evidente que não fico indiferente às críticas sobre os elevados custos da organização. A pesquisa que efectuei não me permitiu certezas sobre essa matéria, mas, acredito que os responsáveis políticos não estarão interessados em desperdiçar recursos que, como todos sabemos, escasseiam cada vez mais e que, numa situação de crise como a que vivemos, poderá ser factor de tensão social altamente indesejável.
Todavia entendo que as cidades de pequena/média dimensão, como a nossa, devem, para além de trabalhar em muitas outras áreas micro, desenvolver iniciativas que elevem o nível hierárquico da cidade e aumentem a sua capacidade polarizadora e atractiva, tornando-as mais competitivas e, nesse sentido, até aceito como bastante provável que esta iniciativa, feitas todas as contas de curto, mas também de médio e longo prazo, não se torne tão assim tão dispendiosa e, antes pelo contrário, possa até ser vista como um investimento.
Reconhecendo que há outras áreas da “agenda cultural” onde, na nossa cidade, se desenvolvem trabalhos meritórios, reconhecidos por todos, como por exemplo no Museu, na Biblioteca ou no Arquivo Municipal, penso questão central, e eventualmente mais criticável que, na minha opinião, não tem sido suficientemente trabalhada relaciona-se mais com a necessidade de enquadrar aquela iniciativa num âmbito muito mais global que obedeça a uma estratégia clara de desenvolvimento cultural que permita a criação de condições para que a Póvoa não seja vista como uma cidade que proporciona a alguns escritores e a muitos poveiros, por melhores que sejam, uma semana densa, divertida e rica e que, relativamente a muitos dos outros parâmetros da realização cultural como o cinema, o teatro, o bailado, a pintura, a escultura,algumas formas de música e tantos outros se assista a um vazio preocupante. A questão dever ser vista, pelos responsáveis, numa perspectiva bem diferente, em que sejam criadas condições, até por eventuais incentivos ou parcerias com o sector privado, para uma agenda cultural muito mais preenchida ao longo do ano, e não só em momentos muito curtos e específicos como é o caso das Correntes, fazendo com que os poveiros não tenham que se deslocar a cidades que “competem” com a nossa para ver uma simples sessão de cinema ou assistir a uma peça de teatro.
Numa perspectiva construtiva e acreditando que “vem aí o Garrett”, seria desejável que o espaço tivesse a polivalência necessária para, não só proporcionar a realização, pontual, de grandes eventos como também de vários “pequenos espaços” que fossem dinamizados pelas mais diversas entidades, nomeadamente recuperando a dinâmica de associações culturais que, noutros tempos tiveram alguma iniciativa ou fomentando a criação de novas associações da sociedade civil.
Infelizmente, pelo que pude consultar das linhas mestras do projecto, apenas está previsto mais um espaço para eventos de menor escala, correndo-se o risco de ficarmos numa situação típica do nosso país em que construímos grandes equipamentos para um uso claramente insuficiente.

7 comentários:

  1. Fantástico. Genial! Se tinha alguma dúvida, após ler este texto, fiquei esclarecido. A visão que o professor Luís tem é extremamente organizada e inteligente, pelo que de si conheço penso que seria uma das poucas pessoas, senão a única, que se poderia candidatar à CMPV pelo PS e desta feita retirar o poder ao PSD. Espero sinceramente que isso esteja dentro dos seus planos, seria fantástico para a cidade e para os Poveiros.

    Cumprimentos

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  2. O correntes ...
    Mesmo não sendo de cá, habituei-me a gostar do correntes. Não me interessa muito quanto gastam na sua organização ... isso não me diz respeito ... nem sei medir o impacto do custo/benefício.
    Mas gosto, participa e sou um espectador mais ou menos atento.
    Acho apenas que o evento é muito concentrado e que se poderia estender mais no tempo, sem que para isso fosse necessário uma verba substancialmente maior.
    Por exemplo, fazer com que todas as 2ª ou 3ª ou 6ª do ano fossem dedicadas às correntes ... Se fossem num dia fixo, todos saberíamos que naquele dia existiria algo de cultural na cidade ...
    Podiam perfeitamente (e aproveitando o já badalado e conhecido termo correntes) alargar o leque e associar à Correntes d'Escritas, as Correntes dos Gestos (Teatro), as Correntes das 3 dimensões (Escultura), as Correntes d'Pincel (Pintura), etc.
    O termo Correntes colaria com facilidade e a Póvoa teria uma vertente mais cultural, que lhe daria um ar mais selecto e atrairia outro tipo e turismo e visitantes de ocasião ...

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  3. Claro que queres mais Correntes. És professor e é uma forma de te veres livre dos alunos.Cansei de ser sério amigo.

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  4. Comentando o último anónimo, presumo que não saiba o que significa ler, e que seja um péssimo profissional apenas pelo que escreveu no seu comentário.

    Bocas de Burro não chegam ao céu

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  5. Independentemente das virtudes de tão nobre iniciativa, parece-me que haveria muitas outras nobres iniciativas (não só culturais) que seria "lindo" que uma Câmara Municipal levasse a cabo. Contudo, nenhuma Câmara as organiza. E porquê? Porque os recursos (sobretudo financeiros) são limitados e, infelizmente, e como tal, "não dão para tudo". Outro problema deste evento é que é necessariamente extremamente caro e demasiado "pontual" (concentra-se num número de dias reduzidos do ano). Mas o pior é que a Póvoa de Varzim é uma cidade que "vive" do turismo, isto é, o turismo deveria ser a principal fonte de captação de receitas do Concelho. Por isso, e mais do que na maioria das cidades, qualquer evento tem que ser analisado também (sublinho, "também" - e não apenas) numa perspectiva economicista, o que me leva a concluir que todo o dinheiro gasto neste evento (que não traz nenhum retorno aos agentes económicos da cidade) poderia ser gasto noutro tipo de eventos socio-culturais que, sendo igualmente nobres, captassem receitas para o nosso empobrecido Concelho.
    Dou o exemplo de dois eventos de Vila do Conde. O Festival de Curtas Metragens tem certamente mais impacto a nível nacional e internacional e a autarquia gasta muito menos dinheiro na sua organização do que a Póvoa com o "Correntes". Por outro lado, a Feira de Gastronomia é um evento que é certamente rentável e atrai mais 400.000 pessoas todos os anos para a cidade. A isto chamo eu "eventos inteligentes". Isto é, eventos que os outros gostariam de ter, mas não organizam. Ao contrário do "Correntes d'Escritas".

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  6. Caro Luis,

    tenho acompanhado a tua entrada nesta área da blogosfera com alguma diagonalidade na leitura mas não consigo deixar de lançar para a leitura alguns pontos de vista pessoais e de quem gostaria que a forma como se abordam temas não caiam em palavras vãs e com sentido "politicamente incorrectas".

    Li o teu comentário sobre a "paz negra" e, permite-me este reparo, foi um pouco infeliz. Para quem deseja entrar no mundo da política por razões de ordem pessoal ou até familiares, não deveria fazer parte do tipo de abordagem que o conjunto de políticos que todos os dias, a comunicação social, nos apresenta. Políticos que dizem mal de tudo e de todos. Se fazes é porque fazes tarde, se não fazes é porque não sabes fazer, se fizeste, fizeste mal...

    Não é esta a políticas de quem quer a mudança. Mudança de mentalidades, mudança de comportamentos, mudança de atitudes... Para isso cada um de nós tem que mudar, e se cada um de nós mudar um pouco que seja, ninguém imagina o que isso representa para as mudanças qe todos desejamos.

    Pequenos gestos diários de "paz", fazem um grande gesto para a humanidade.

    Todos os dias, para que a nossa vida "corra" de feição, pedimos paz e harmonia... será hipocrisia da nossa parte então, comentar pelo lado negativo um evento que por si só representa vontade de mudar.

    Se for verdade que a paz está dentro de cada um de nós e por isso poderá estar entre todos nós, pensemos por momentos que a nossas atitudes podem refletir muito no que cada um de nós representa.

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  7. Sobre o reparo aqui feito sobre as “construções na areia”, expando para o que anteriormente referi num prévio post por mim colocado sobre o interesse local e os interesses pessoais. Quão distintos são estes actos, “aparentemente iguais”!
    Alterando um pouco a orientação deste post, não consigo deixar de partilhar este momento com todos os cibernautas que visitam este blogue: (até para ti caríssimo amigo).
    Acabo de chegar a casa. Passa das 2h30m da madrugada e amanhã tenho de acordar cedo para que consiga cumprir com as minhas obrigações profissionais. No entanto, parece-me que duas ou três linhas, não hão-de roubar-me assim tanto tempo quanto isso para argumentar o que tenho escrito sobre os interesses locais, e os interesses pessoais dos quais temos sido espectadores activos com intervenção passiva.
    Hoje (ontem) 25 de Março de 2009, houve o habitual jantar comemorativo do Varzim Sport Clube. Comemorou-se o seu 93º aniversário. Os que estiveram presentes, conseguiram ver e ouvir. Para os que não estiveram, aqui vou tentar relatar o que mais me preocupou:
    O Dr. Lopes de Castro elogiou, até não mais conseguir, a associada Raquel meritória de receber o troféu Lobos-do-mar, troféu supremo do Varzim Sport Clube. (será que o facto de ser filha do maior e melhor patrocinador do Varzim Sport Clube teve alguma influência? (CASA DO PAPEL)). Fica a suspeita.
    O Eng. Aires Pereira, em representação da CMPVZ, voltou a lembrar o corte dos apoios da autarquia ao Clube Poveiro, tal como o Sr. Presidente Macedo Viera o tem já feito, nomeadamente no passado jantar, mas, naturalmente, com um dom da palavra superior ao do Presidente. Será verdade??? (Eu particularmente não me acredito).
    O Presidente da assembleia-geral, o Dr. José Maria Reina, homem que muito aprecio, falou de forma nebulosa sobre uma possibilidade em o Presidente da direcção lhe conceder o cargo, embora tudo tenha sido dito nas entrelinhas do humor, pois nada mais disse.
    Agora questiono eu e apenas eu:
    Ou esta gente (no caso a direcção do Varzim Spot Clube), é realmente gente de altíssimo valor humano, ou então estamos a falar mesmo de interesses pessoais enormes dentro de todos os milhões (mais de 100 milhões de euros) que envolvem o processo estádio tudo com a mão no peito, o hino Varzinista ao rubro e as “camisolas e cascois levantados.
    Penso que daqui às “construções na areia” é relativamente fácil de chegar.

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