Estou velho. Sou professor do ensino secundário desde Novembro de 1981, altura em que esta profissão ainda não era sinónimo de desemprego. Na verdade, no ano lectivo 1981/82 conciliei os meus estudos na Universidade do Porto com a actividade docente numa simpática escola de Esposende. Por incrível que pareça, o exercício da profissão e a conclusão da licenciatura, não só não se mostraram incompatíveis como funcionaram como elemento estruturante da minha formação geral dado que aperfeiçoei capacidades relacionadas com o empenho, a persistência, a organização e a valorização do essencial em detrimento do acessório.
Desde essa altura, e apesar do exercício de praticamente todos os cargos possíveis numa organização escolar, habituei-me a trabalhar com dezenas e dezenas de alunos, nos primeiros anos eram mesmo centenas, dado que houve escolas em que ainda leccionei para turmas com mais de quarenta elementos.
Reconhecendo muitas vantagens inerentes ao exercício desta profissão, nomeadamente em termos de flexibilidade horária para o trabalho da componente não lectiva, que me permitiram orientar a vida para um quotidiano mais saudável que muitos colegas que optaram por outras profissões, tenho, também, que salientar que se trata, ao mesmo tempo, de uma profissão de enorme desgaste dado que o trabalho com jovens é, por natureza, complexo e denso. Por outro lado o clima de conflitualidade que teima em persistir no sistema educativo acentua o cansaço e, infelizmente, tem levado nestes últimos tempos ao abandono de excelentes profissionais que me habituei a ver como autênticas referências e modelos a seguir.
Após dezenas de anos a trabalhar sempre com tantos alunos fui confrontado, pelo Conselho Executivo da minha escola, com a necessidade de aprender uma nova profissão, dado que fui indicado para funcionar como profissional RVC, no âmbito do programa Novas Oportunidades, dado que na minha actual escola passou a existir um dos muitos Centros Novas Oportunidades.
Estou, no fundo, a começar a exercer uma nova profissão sem que esse facto tenha correspondido a uma vontade própria, dado que, apesar de todo o desgaste, aquilo que, claramente, gosto de fazer, penso que razoavelmente -perdoem-me a imodéstia, é trabalhar com os alunos e estar no espaço da sala de aula. Embora compreenda os motivos que levaram a direcção da minha escola a incluir-me, a tempo inteiro, na equipa do nosso CNO, continuo a lamentar a alteração profissional a que fui sujeito.
Como os tempos actuais não são de reivindicações mas de valorização do emprego (aliás, por maneira de estar, também seria difícil que tivesse outra atitude) iniciei-me nesta aventura das Novas Oportunidades, apanhando um “barco em andamento” que, podemos dizer, está para os adultos como o Magalhães para as crianças. Na verdade, eu e os meus colegas iniciámos esta nova etapa sentindo que pisávamos terrenos armadilhados dado que as opiniões dos políticos e dos fazedores de opinião se situavam num ou noutro extremo da avaliação possível. Isto é, de um lado tínhamos os que consideravam este programa Novas Oportunidades excelente para a Educação de adultos enquanto outros o associavam apenas às estatísticas e ao facilitismo.
A publicação dos links para os vídeos “Gandas Oportunidades” e “Novas Oportunidades - Só Virtualidades?” pretende, precisamente, marcar o contraste entre estas duas formas extremas de observação da mesma realidade/fenómeno.
O curto período de trabalho nesta iniciativa permitiu-me contactar, de muito perto, com estas duas sensibilidades.
Muitos dos responsáveis do programa (ou a ele associados pela formação) falam da iniciativa de um modo extremado em que só há uma verdade, a da excelência do programa. Em alguns momentos do meu percurso formativo e, felizmente, apenas com alguns dos responsáveis senti que havia uma repetição de slogans definitivos, do tipo “quem não está por mim está contra…” e não havia tanto a capacidade de demonstrar que este tipo de oferta era a que melhor se adequava à realidade da nossa população adulta.
Um conjunto significativo de portugueses, talvez a grande maioria, pensa exactamente o contrário associando o programa apenas ao facilitismo e ao trabalho para a obtenção de resultados estatísticos demonstrando, em muitas situações, uma grande ignorância acerca das possibilidades associadas à iniciativa. Esta ignorância, por incrível que pareça, está associada a algumas das nossas mentes brilhantes e fazedoras de opinião que, nomeadamente no que diz respeito ao acesso ao ensino superior demonstram desconhecimento e superficialidade.
Torna-se assim importante que, algures entre os dois extremos, se encontre uma posição mais ajustada, em que se valorize todos os casos de certificação de adultos que, efectivamente conseguiram ao longo da vida adquirir as competências chave previstas para a conclusão do ensino secundário e que o regresso à escola possibilitou a sua demonstração. Para isso é fundamental que os centros apoiem este regresso dos adultos à escola mas, em simultâneo, sejam rigorosos nas formas de avaliação, nem que, para isso, não consigam cumprir as metas definidas pela ANQ.
Outro aspecto importante relaciona-se com a necessidade de associar estas iniciativas à produtividade, contribuindo para a melhoria das práticas de todos os adultos nos seus postos de trabalho e nas suas empresas.
Um último ponto importante para reflexão relaciona-se com a necessidade de investir, cada vez mais, na escolaridade básica porque, não havendo mudanças significativas na sua qualidade, estaremos a remediar um problema no topo que não deixará de ser alimentado pela base.
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